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Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS): Requisitos legais para obtenção por Organizações da Sociedade Civil (OSC)

A obtenção do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS) possibilita a organizações da sociedade civil sem finalidade lucrativa usufruir da imunidade das contribuições para a Seguridade Social, prevista pelo parágrafo 7º do artigo 195 da Constituição Federal, além de garantir a priorização na celebração de contratualização/convênios com o Poder Público.

Os requisitos para a obtenção do CEBAS encontram-se previstos pela Lei Complementar nº 187/2021, a qual determina a necessidade de satisfação de critérios específicos de acordo com a área de atuação da entidade, que pode exercer atividades e objetivos relacionados às áreas da Educação, Saúde e Assistência Social.

No que concerne especificamente às entidades que atuam com projetos diversificados, característicos da área de Assistência Social, merece atenção a observância da Lei n.º 8.742/1993 (LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social), devendo a entidade estar regulamente constituída com objetivos compatíveis com as atividades e público-alvo previstos pelo diploma legal e resoluções normativas, especialmente a Resolução CNAS nº 109, de 11 de novembro de 2009, que orienta sobre a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais.

Para além do alinhamento dos objetivos e atividades da entidade, é necessário que os projetos estejam voltados a serviços, programas ou projetos socioassistenciais de atendimento ou de assessoramento ou que atuem na defesa e na garantia dos direitos de pessoas em situação de vulnerabilidade, tais como pessoas idosas, pessoas com deficiência, famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, crianças e adolescentes em situação de risco e vulnerabilidade, pessoas em situação de rua, dentre outros indivíduos que necessitem de atuação estatal.

Além disso, as entidades beneficentes deverão obedecer ao princípio da universalidade do atendimento, ofertando seus serviços de forma gratuita a seus usuários. É primordial, nesse sentido, comprovar documentalmente a destinação da maior parte de seus custos e despesas a serviços, programas ou projetos no âmbito da assistência social, sendo vedado dirigir suas atividades em benefício dos próprios associados ou de categoria profissional.

Somam-se aos requisitos relacionados à área de atuação da entidade outras exigências comprobatórias previstas pela LC n.º 187/2019, tais como previsões específicas no ato constitutivo da entidade, registro nos Conselhos Nacional e Municipal de Assistência Social, demonstrações contábeis e financeiras, comprovações de regularidade fiscal e trabalhista, dentre outras.

Em todo caso, é de suma importância contar com a assessoria jurídica especializada para identificação do cumprimento dos requisitos legais, não apenas no momento de concessão da certificação, mas também para possibilitar a regular renovação e fruição dos seus benefícios.

Dra. Letícia Agostinho Mouro
OAB/MG nº 200.984

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As limitações da Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade como instrumentos de planejamento sucessório

Muito se fala sobre os institutos da Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade como instrumentos de planejamento sucessório e patrimonial, quando a intenção é adiantar o legado aos herdeiros, porém, protegendo-o de possíveis invasões por parte de credores, cônjuge ou do próprio receptor da transmissão Nesse sentido, tias cláusulas veem ganhando status de verdadeiras barreiras protetoras contra atos que atentem contra a integridade do patrimônio legado, quando, de fato, representam uma proteção razoável, mas relativa. Por isso, antes de adotar qualquer planejamento que pretenda uma suposta blindagem patrimonial (termo inadequado, mas que aqui se refere pela popularidade que adquiriu), há de se entender as características que podem torna-lo menos efetivo do que o esperado.

Conforme de conhecimento, os institutos de “inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade” são todos frutos da disposição de vontade de quem grava os bens ao tempo da transmissão gratuita (ato de liberalidade), não sendo passíveis de aplicação ao acervo legatário da legítima, senão quando presente a denominada justa causa. Além disso, há algumas questões legais que podem não satisfazer a pretensão do doador/testamenteiro, quando a sua utilização pressupõe uma suposta “proteção absoluta”.

Abaixo são apontados os principais pontos que podem ajudar a compreender e definir a exata aplicação dos institutos:

Abrangência: Pelo que prevê o art. 1.911 do Código Civil, o estabelecimento de Cláusula de Inalienabilidade pressupõe impenhorabilidade e incomunicabilidade, porém, por decisão recente da Quarta Turma do STJ (já amplamente aceita pela doutrina), o inverso não ocorre. Ou seja, a existência de qualquer das cláusulas de Impenhorabilidade o Incomunicabilidade não pressupõe o efeito de inalienabilidade. Dessa forma, o uso das limitações deve ser baseado nessa interpretação, a fim de gerar os efeitos desejados.

Legítima: Como atos incidentes sobre a disposição gratuita, em muitos casos utilizada como adiantamento de herança, há de se considerar que a doação dos bens com cláusula de Inalienabilidade, Incomunicabilidade e Impenhorabilidade somente pode ser realizada de forma injustificada, quando tratar-se da fração dos bens não compreendidos pela legítima (parcela dos bens destinadas aos herdeiros necessários – 50%). Pelo que dispõe o art. 1.848 do Código Civil, quando a doação recair sobre os bens da legítima, tal ato somente será considerado lícito quando dotado de uma justificativa razoável, que motive a restrição da limitação. Contudo, por ser uma verificação a posteriori, não se trata de um dispositivo que visa impedir a realização da liberalidade, mas que pode trazer uma revisão de legalidade no futuro, se questionado por qualquer interessado (ex. vi. credor/meeiro/proprietário).

Exceções: Mesmo havendo grande proteção imposta pelas cláusulas de Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade, algumas exceções podem frustrar as expectativas de que as inclui dentro de um planejamento sucessório. São elas:

a) Execução Fiscal: Conforme prevê o art. 30 da Lei de Execuções Fiscais, os bens gravados com Impenhorabilidade e Inalienabilidade estão sujeitos à penhora, não sendo contemplados nessa exceção apenas os bens absolutamente impenhoráveis (como o bem de família);

b) Execução Trabalhista: Valendo-se da interpretação analógico do texto da LEF, muitas decisões trabalhistas já relativizam a impenhorabilidade, por entender que são um obstáculo à reparação do trabalhador, sendo violadoras das regras de dignidade, por proteger o patrimônio de uma pessoa, em detrimento do prejuízo patrimonial de outra (considerada hipossuficiente). (Alguns julgados: AIRR-88800-06.1996.5.02.0023, AIRR – 671-54.2015.5.06.0018, AIRR – 153100-09.2006.5.06.0022.

c) Frutos: Independentemente da limitação aplicada ao bem, seja contra alienação pelo proprietário, comunicação do patrimônio conjugal ou penhora por débitos, há o entendimento majoritário de que os frutos percebidos pelo proprietário não sofrem a restrição imposta ao bem. Nesse sentido, caso seja um bem imóvel, pode-se exemplificar o aluguel ou a renda do bem como um exemplo claro de possível penhora, enquanto, ao se falar em quotas de sociedade, os lucros ou bens que integram o patrimônio empresarial possam ser alvo de constrições.

Portanto, ainda que haja grandes vantagens na proteção do patrimônio transmitido aos sucessores, a limitação deve ser bem estudada e ponderada, posto que a imposição também traz inconvenientes para os próprios receptores, eis que a limitação pode operar em desfavor de uma disponibilidade plena do bem, como ocorre com a Inalienabilidade, impedir a plena disposição voluntária em casos extremos, como a restrição de oferta do bem em penhora (obrigando o sucessor e dispor de bem pessoal mais valioso, se alvo de execução) e não reverter-se em grande resultado, se o regime de casamento do sucessor for o da comunhão parcial de bens.

Por esse e outros motivos, recomenda-se que o Planejamento Sucessório perpasse maiores estudos, um entendimento profundo do caso e a definição de um arranjo estruturado na vontade do sucedido e características particulares dos sucessores.

Dr. Homero Gonçalves

OAB/MG 99.915

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As penalidades pelo descumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados começarão a ser aplicadas pela ANPD

Foi publicado no dia 27/02 o Regulamento de dosimetria e Aplicação de Sanções Administrativas, aprovado por meio da Resolução CD/ANPD nº 4, pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados.
Para a construção do regulamento e das diretrizes para a aplicação das penalidades ocorreram diversas tomadas de subsídios pela autoridade, de forma a estabelecer os parâmetros para a realização da dosimetria (cálculo da penalidade).
Assim, a Autoridade está apta a exercer a sua função sancionadora e exercer o disposto nos artigos 52 e 53 da Lei Geral de Proteção de Dados, que prevê as seguintes penalidades que podem ser aplicadas à parte infratora:

• Advertência;

• Multa simples de até 2% do faturamento da empresa que poderá chegar até R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais);

• Multa diária que poderá chegar até 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais).

• Publicização da infração;

• Bloqueio dos dados pessoais aos quais se refere a infração ;

• Eliminação dos dados pessoais aos quais se refere a infração

• Suspensão parcial do funcionamento do banco de dados ao qual se refere a infração;

• Suspensão do exercício da atividade de tratamento dos dados pessoais aos quais se refere a infração;

• Proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas ao tratamento de dados.

Frisa-se que as sanções poderão, ainda, ser aplicadas cumulativamente com outras medidas administrativas pela ANPD.
O exercício do poder sancionador pela Autoridade se revela importante não somente pelo caráter repressivo da sanção mas também pelo caráter preventivo, que visa coibir a prática reiterada das infrações realizadas.
As empresas que ainda não se adequaram para a garantia da segurança da informação e proteção de dados pessoais precisam, mais do que nunca, promove-las, já que as penalidades começarão a ser aplicadas e podem afetar o funcionamento da empresa (por exemplo em caso de proibição de tratamento de dados pessoais), o fluxo de caixa (em caso de aplicação de multa) e a sua reputação (caso ocorra a publicização da infração).

Dra. Juliana Costa Martins

OAB nº 192.789

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A Nova Resolução do Conselho Federal de Medicina e a Medicina Baseada em Evidências (MBE)

Recentemente, o Conselho Federal de Medicina aprovou a Resolução CFM n.º 2.327, de 08 de dezembro de 2022, que dispõe sobre a aplicação de terapêuticas reconhecidas no exercício da profissão médica. A nova Resolução busca impedir a proliferação de práticas pretensamente terapêuticas, cuja eficácia não tenha sido avaliada pelo CFM.

A norma editada reitera previsões já estipuladas em outras normativas do Conselho, consistindo em importante instrumento para balizar as regras de conduta voltadas à autonomia do profissional médico, notadamente na busca por tratamentos alternativos.

Com efeito, no âmbito do direito médico, a autonomia atribuída ao profissional deve ser interpretada de acordo com os preceitos que compõem o nosso ordenamento, na compreensão dos pilares dos direitos fundamentais previstos na Constituição (vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade — artigo 5º, caput), assim como os direitos da personalidade do Código Civil (vida, liberdade, integridade, sociabilidade, honra, imagem, nome, privacidade — artigo 11 a 21), os quais são invioláveis.

Neste debate, acerca dos limites da autonomia médica, assume relevo o conceito de Medicina Baseada em Evidências (MBE), a qual tem insurgido como parâmetro de atuação e conduta terapêutica fundamentada em em evidências clínicas científicas, resultantes de processos de produção e de revisão de conhecimentos,   preferencialmente    oriundos    de    achados em pesquisas clínicas metodologicamente  estruturadas.

A concepção busca integrar a experiência clínica individual à melhor evidência externa disponível, possuindo três pilares: (i) evidências científicas provenientes de estudos randomizados e metodologicamente consistentes; (ii) experiência clínica dos profissionais; (iii) preferência, consentimento e valores dos pacientes.

A adoção de condutas terapêuticas alinhadas com os critérios acima é acolhida pela legislação brasileira,  conforme previsão do art. 19-Q da lei 8.080/1990, acrescentado pela lei 12.401/2011, o qual estipula que na incorporação, na exclusão ou na alteração pelo Sistema Único de Saúde (SUS) de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como na constituição ou na alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, devem ser consideradas as evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança do medicamento, produto ou procedimento objeto do processo. O tema também tem sido acolhido em sede de decisões judiciais, para as quais a Medicina Baseada em Evidências (MBE) pode contribuir para a adoção de soluções guiadas pela melhor técnica.

Nesse sentido, é de suma importância que o processo de incorporação e aprovação de novas terapêuticas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), conforme previsto na Resolução n.º 2.327/2022, não permita que,  em  nome  da  autodeterminação  terapêutica,  sejam  incorporados  ao  sistema  de  saúde  e ofertados   à   população   novos   fármacos,   novos   produtos,   novos   procedimentos,   novas  tecnologias, novos protocolos clínicos e novas diretrizes terapêuticas cuja segurança, eficácia e acurácia estejam lastreadas em evidências com baixo grau de qualidade.

A atenção e estudo a este debate permite identificar que evidências científicas têm muito a contribuir para o atendimento do critério objetivo legal de incorporação de tratamentos e medicamentos.

Dra. Letícia Agostinho Mouro
OAB/MG nº 200.984

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